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Fibra de vidro e indústria náutica, o que foi solução no passado é problema no presente e futuro


Primeiro, o que é fibra de vidro

Sua história é antiga, e remonta a civilizações que já não existem. Os  fenícios e egípcios foram duas delas que fizeram o vidro, e ambas transformaram o material em fibras, ou fibra de vidro. Em geral, eram usadas como decoração.


Muito séculos depois, em 1870, foi desenvolvido um processo de produção em massa de fios de vidro com um processo de jato de vapor para fazer o que foi chamado de lã mineral. Este material foi usado como um isolamento.



Dez anos depois, Herman Hammesfahr obteve a patente de um tipo de tecido de fibra de vidro. Muitos estudos e melhorais depois, em 1942 era usado em peças de avião, nos Estados Unidos durante o esforço de guerra. Eram laminados plásticos de baixa pressão feitos de tecido de fibra de vidro patenteado impregnado com a resina.


A fibra de vidro é um material composto pela aglomeração de finíssimos filamentos de vidro não rígidos e flexíveis. Essas pequenas fibras são unidas pela aplicação de resina de poliéster (ou outro tipo de resina), feitos com material plástico, derivado do petróleo. Em seguida, é colocado no material substâncias que catalisam o processo de polimeração.



Fibra de vidro e indústria náutica: de solução a problema

Da época do fenícios para cá, a população mundial explodiu, entre outras novidades. A madeira, que começava a escassear, era cara. E a fibra de vidro contribuiu para o boom da indústria náutica.


Em 2016 o valor total das embarcações de recreio vendidas atingiu mais de 3,6 bilhões de dólares no Estados Unidos’, onde a mesma pesquisa diz que ‘mais de 87 milhões de pessoas usam barcos para atividades de laser. E mais: em 2015 11,87 milhões de barcos de recreio foram registrados nos Estados Unidos.


Isso, em apenas um país, apesar dos Estados Unidos serem o país mais rico do mundo. Impossível calcular quantos barcos de recreio existem no mundo hoje. Mas os dados do país de Tio Sam nos dão uma boa ideia.


De acordo com o estudo Uma visão geral do segmento da construção náutica, turismo e lazer no Brasil, de autoria  de Delmo Alves de Moura: Professor da Universidade Federal do ABC – UFABC, e Mestre em Engenharia Naval pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, “a frota nacional de embarcações de esporte e lazer está estimada em cerca de 53.000 unidades.”


Descarte de barcos de fibra doe vidro prejudicam a vida marinha

A matéria foi escrita pela bióloga Corina Ciocan: “O problema de gerenciamento e descarte de barcos em fim de vida se tornou global, e algumas nações insulares estão até preocupadas com seus aterros já sobrecarregados.”


Corina lembra que foi a resiliência e durabilidade da fibra de vidro transformaram a indústria náutica possibilitando a produção em massa dos barcos de lazer. “No entanto”, ela lembra, “os barcos que foram construídos no boom da fibra de vidro das décadas de 1960 e 1970 estão morrendo.”


Corina explica que “podemos afundá-los, enterrá-los, cortá-los em pedaços, triturá-los ou até enchê-los de composto e fazer um grande sinal de boas-vindas, bem no meio das praças de entrada de cidades litorâneas. Mas há muitos deles e estamos ficando sem espaço.”


Para onde vão os barcos velhos?

Segundo a autora do Guardian, a maioria vai para aterros sanitários, mas nem eles suportam mais a quantidade. Muitos são descartados no mar, seus proprietários preferem afundá-los, ou deixá-los num canto qualquer do litoral. É mais barato e mais fácil, que buscar outra solução. E isso também acontece no Brasil.


A maioria dos barcos atualmente vai para aterros sanitários. No entanto, muitos também são descartados no mar, geralmente simplesmente fazendo um furo no casco e deixando-o afundar em algum lugar da costa.


O efeito cumulativo de barcos abandonados

Um otimista poderia sugerir que fossem transformados em recifes artificiais. Ocorre que não basta afundar qualquer tipo de material para formá-lo em recife artificial. São necessários estudos, no caso da fibra de vidro, ainda incipientes.


Corina Ciocan diz que “a preocupação é que eventualmente esses barcos se degradem e se movam com as correntes e prejudiquem os recifes de coral, acabando por se decompor em microplásticos.”


Informação parcialmente confirmada pela autora:”Recentemente, os cientistas investigaram os danos aos habitats de manguezais, ervas marinhas e corais e, embora os efeitos tenham sido registrados apenas em uma base relativamente localizada por enquanto, o efeito cumulativo de barcos abandonados pode aumentar exponencialmente nos próximos anos.”


Ela cita o exemplo de pesquisadores da Universidade de Plymouth que encontraram “altas concentrações de cobre, zinco e chumbo em amostras de sedimentos e dentro das entranhas de ragworms em dois estuários no leste da Inglaterra (Orwell e Blackwater)”. E lembrou que estes contaminantes são oriundos de tintas descascadas de barcos abandonados nas proximidades. Apenas a tinta, imagine a fibra de vidro de milhões de barcos.


As tintas são apenas a ponta do iceberg dos barcos de lazer que ainda utilizam borracha, plástico, madeira, metal, têxteis e, claro, óleo. E, diz Corina, “além disso, o amianto era amplamente empregado como isolante em escapamentos e tintas com chumbo eram comumente usadas como inibidor de corrosão, ao lado de compostos à base de mercúrio e tributilestanho (TBT) como agentes anti-incrustantes.”


Fibra de vidro em crustáceos

Já lembramos por aqui a pandemia de plástico que infesta os mares, e os danos provocado à vida marinha. A quantidade de microplásticos é de tal ordem que até no sal de mesa já foram encontradas partículas. O mesmo acontece com a fibra de vidro.


A bióloga e escritora descobriu trabalhando: “A fibra de vidro é filtrada por crustáceos marinhos (em minha própria pesquisa, encontrei até 7.000 pequenos fragmentos em ostras em Chichester Harbor, no sul da Inglaterra) ou se agarram às conchas de pequenas pulgas d’água e as afundam no fundo do mar. O material particulado acumulado no estômago dos moluscos pode bloquear seu trato intestinal e, eventualmente, levar à morte por desnutrição e fome.”


E Corina alerta: “Há um enorme potencial para que essas partículas minúsculas de barcos antigos se acumulem em animais maiores à medida que são transferidas para cima na cadeia alimentar.”


“Essas micropartículas são as resinas que mantêm a fibra de vidro unida e contêm ftalatos, um grande grupo de produtos químicos associados a graves impactos na saúde humana.”


Por João Lara Mesquita






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